Leonardo Valle

Qual é o impacto que as substâncias químicas usadas em cosméticos e produtos de higiene pode causar ao meio ambiente? De acordo com o professor de ciências farmacêuticas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Rilton Alves de Freitas, depende do tipo de produto.

“Os leave-on são aqueles que permanecem na pele por um período, como perfume, maquiagem, batom, esmalte, creme e antitranspirante”, conta.

“Os rinse-off são os enxaguados, caso dos xampus, sabonetes e géis de banho. Esses são ambientalmente mais impactantes, pois são utilizados em grande quantidade, pela maioria da população, diariamente e são despejados no esgoto”, compara.

Entre as substâncias que escorrem pelo ralo, estão conservantes, como parabenos (com potencial cancerígeno), aromatizantes, substâncias com proteção UV e até microplásticos – no caso dos esfoliantes.

O problema, segundo o docente do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP-São Carlos), Eduardo Bessa Azevedo, é que as estações de tratamento de água não são eficientes na remoção de substâncias químicas.

“Elas extraem apenas o material orgânico presente no esgoto. Assim, as substâncias químicas podem acabar nas águas, impactando organismos aquáticos e, posteriormente, o homem ou as redes de abastecimento da população”, alerta.

Tais substâncias são chamadas de “contaminantes emergentes”, pois não há legislação ou referências sobre uma concentração ideal que pode estar na água. “Desconhece-se o que acontecer daqui a 30 anos se esses químicos forem consumidos periodicamente”, diz Azevedo.

Descarte preocupa

Os leave-on também apresentam consequências danosas à natureza. “Seja durante a produção – que exige água, corantes e descarta químicos no meio ambiente – seja pelo consumo desenfreado e descarte”, relata a engenheira ambiental e professora da Universidade Anhanguera, Patricia Maehata.

A forma de consumo, nesse caso, é relevante. “Por exemplo, um batom tende a ser usado pela consumidora até o final, havendo pouco descarte do produto. Já um creme pode ser descartado com sobras, muitas vezes, porque venceu”, diferencia.

Maehata estudou batons e produtos labiais e encontrou aproximadamente 18 diferentes tipos de metais em suas fórmulas.

“Há níquel, cobalto, cobre e ferro, metais que estão no ciclo natureza. Contudo, sobrecarregamos o meio ambiente ao ‘lançar’ uma maior quantidade dessas substâncias nele”, afirma.

“A concentração dos metais descartados é mínima. Contudo, se pensarmos na quantidade de consumo e seu impacto em longo prazo, poderá haver uma contaminação significante do solo daqui a 40 anos”, projeta.

Segundo o professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Sérgio Thode, o descarte dos cosméticos e produtos de higiene é preocupante porque nem todos resíduos têm a destinação correta e podem chegar ao solo.

A Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe) aponta que, em 2018, apenas 59,5% das 79 milhões de toneladas de lixo gerados no Brasil receberam destinação adequada nos aterros sanitários.

Thode pesquisou a logística reversa dos esmaltes. “Esse produto possui compostos extremamente tóxicos, como tolueno, xileno e formaldeídos, além de cromo e níquel”, apresenta.

Um levantamento da consultoria Nielsen (2010) apontou que são vendidos aproximadamente 600 milhões de vidros de esmaltes por ano. “Ou seja, produzimos e descartamos algumas piscinas olímpicas de resíduos tóxicos desse produto”, ilustra.

Para Thode, mitigar o problema exige separar o resíduo do vidro – esse, sim, reciclável. “Dilua o produto em óleo de banana, despeje em um algodão e encaminhe ao lixo doméstico”, ensina. “Lembrando que jogar na pia pode contaminar a água e, depois de seco, o produto pode entupir canos e galerias”, adverte.

O Plano Nacional de Resíduos Sólidos define que todos os envolvidos no processo de produção e consumo de um produto são responsáveis pelo seu descarte. Dessa forma, o professor recomenda ao consumidor comprar esmaltes de empresas que possuem planos de logística reversa, ou seja, que disponibilizam pontos de coleta de embalagens usadas.

“Infelizmente, são a minoria”, lamenta. “Além disso, o que faz o consumidor levar o produto a um ponto de coleta é uma contrapartida financeira, um brinde ou descontos na próxima compra. Apenas a justificativa de preservação do meio ambiente não sensibiliza”, pontua.

Mais sustentáveis 

Outra opção menos prejudicial é buscar cosméticos com menor impacto ambiental, como os biodegradáveis. “Esses possuem substâncias químicas que podem ser decompostas ou destruídas pela ação de micro-organismos e bactérias”, define Freitas..

“Os cosméticos orgânicos devem possuir, minimamente 95% dos ingredientes naturais com produção certificada orgânica”, esclarece Freitas. “Por sua vez, produtos com ingredientes orgânicos devem ter de 70 a 95% desses materiais”, diz. Além disso, o professor da UFPR ressalta que nem todo ingrediente natural é biodegradável. As matérias-primas inorgânicas encontradas em maquiagens em pó, por exemplo, não o são.

O consumo consciente também não deve ser deixado de lado no caso dos produtos naturais e orgânicos. “A produção em larga escala também pode trazer impactos ambientais, associados ao extrativismo das matérias-primas”, orienta Freitas.

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Crédito da imagem: Alina Rosanova – iStock

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