A Comissão Especial do Plano Nacional de Educação (PNE – PL 8035/10) retomou as análises sobre o texto do assunto na Câmara dos Deputados. Duas versões estão em jogo: a aprovada pela própria Câmara, em junho de 2012 e a referendada pelo Senado Federal, em dezembro de 2013.

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Em entrevista exclusiva ao NET Educação, o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação – rede composta por mais de 200 entidades e movimentos distribuídos por todo o Brasil – defende a versão da Câmara como a mais apropriada para avançar o ensino no país. “Os parlamentares terão que refletir bastante, pois a decisão trará efeitos grandes para a educação”, acredita.
A proposta deverá ser votada até o dia 12 de março pela Comissão Especial, de acordo com a Agência Câmara. Então, o PNE deverá seguir para o Plenário. Enviado pelo presidente Lula ao Congresso Nacional em 15 de dezembro de 2010, o PNE completou três anos de tramitação no final do último ano. Acompanhe a entrevista abaixo.

“Os textos, em termos de conteúdo, são bem diferentes”, analisa
Daniel Cara (Crédito: Campanha Nacional)
NET Educação – A Câmara iniciou os trabalhos para decidir sobre o texto do PNE. Quais são os caminhos que os deputados podem seguir?
Daniel Cara – Agora o PNE está na etapa terminativa. Eles vão escolher entre o texto construído na Câmara ou o do Senado. O que podem também é escolher pontos de um texto e do outro compondo um terceiro, mas não criar nada novo. Esperamos que essa etapa seja mais rápida do que foi até agora, mas não é tão simples. Os textos, em termos de conteúdo, são bem diferentes. Os parlamentares terão que refletir bastante, pois a decisão trará grandes efeitos para a educação.
NET Educação – Há preocupações?
 
Cara – A grande preocupação é que o Senado retirou do texto a estratégia que previa a responsabilidade da União em ajudar estados e municípios com investimento de recursos na educação básica. O da Câmara obriga mais responsabilização e encontra maior apoio da comunidade educacional, enquanto o governo federal prefere a versão do Senado.
Também, a do Senado não determina metas de expansão da rede pública de educação técnica de nível médio. Fala apenas em ensino gratuito, que pode incluir instituições privadas. Além de não prever metas de expansão da rede pública de ensino superior.
NET Educação – Quais são os principais riscos para uma educação de qualidade?
Cara – Com o do Senado especialmente a educação básica de qualidade será prejudicada. Sabemos que os recursos que estados e municípios têm são insuficientes, a União precisaria ajudar. Lembro até uma pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade de Brasília que revelou só 0,6% das escolas do país terem um padrão mínimo de qualidade e queremos mudar isso (link). Ainda, na prática, desobriga evoluir na educação técnica e ensino superior. Só Prouni e Pronatec não são suficientes para isso.
NET Educação – O Senado cometeu equívoco, em sua opinião? Por quê?
Cara – Sim, porque só se preocupou com expansão de matrículas. Já a versão da Câmara traz expansão com mais qualidade, um padrão mínimo. Não é idealmente o que precisamos em termos de desenvolvimento da sociedade, mas é um primeiro passo. O texto do Senado é mais do mesmo. O governo até pode conseguir cumprir o que tem ali, mas a educação não vai mudar.
NET Educação – Quais são as metas mais prejudicadas com as alterações feitas no Senado?
Cara – A quatro, cinco, 11, 12 e 20. A quatro já não tem mais jeito, pois a da Câmara é ruim e do Senado é pior [que trata da universalização da educação, com o atendimento escolar aos estudantes com deficiência e transtornos]. A 11 é sobre a educação técnica e a 12 corresponde à educação superior. A cinco fala sobre alfabetizar todas as crianças até os oito anos de idade. [Veja o quadro comparativo entre as duas versões do PNE construído pela Campanha Nacional].
NET Educação – A 20 é a questão do financiamento para educação.
Cara – Isso. O Senado não retirou o CAQi [Custo Aluno Qualidade Inicial é um índice que traz o valor por aluno calculado para atingir o mínimo de qualidade no ensino], mas retirou a responsabilidade. E o CAQi só vai efetivar se tiver participação da União. Hoje, estados e municípios aplicam R$ 100 bilhões no Fundeb por ano e a União colabora com outros R$ 10 bilhões. Se fizermos uma analogia, enquanto estados e municípios investem R$ 1, União colabora com 10 centavos e esse valor deveria ser de no mínimo 50 centavos por ano para conseguir cumprir o CAQi.
NET Educação – O que já ressaltaria como conquistas das versões dos textos do PNE?
Cara – O do Senado traz mais matrículas, no entanto não resolve o problema. Já se for aprovado o texto da Câmara tem avanço grande, pois estabelece um novo paradigma. Na Comissão Especial do PNE, há um compromisso de aprovar o texto da Câmara. Mas como todo comprometimento político, será preciso brigar para que seja assim. Por enquanto, em relação à Comissão estamos em vantagem. Agora, no Plenário, o jogo é outro, porque o governo tem ampla maioria. É uma disputa mais difícil de ser travada, que pende ao texto do Senado.
De acordo com nossos cálculos, considerando a obediência na hora do voto, ou seja, que a base do governo vota no governo, a média é mais ou menos 230 votos para o governo e 170 contra. Isso nas matérias relativas à educação de 2011 para cá. O ponto de inflexão foi a votação dos royalties do petróleo. Nessa vencemos por unanimidade, porque tinha reflexo muito grande das manifestações de junho. Os deputados estavam com receio.
NET Educação – Acha que a aprovação do PNE corre o risco de ficar para 2015?
Cara – Exatamente, porque supondo que alcancemos unanimidade na Comissão Especial que é formado por todos os partidos, e podemos conseguir, o governo pode não querer que seja votado no Plenário. Pensar em jogar para 2015 por não ter mais o peso da questão eleitoral. Ou a presidenta Dilma vai para eleição sem ter o plano aprovado, o que já é uma situação ruim, ou tentam aprovar antes das eleições, mas se ganhar o texto do Senado, a comunidade educacional é quem vai se posicionar contra a decisão e o governo. O que pode não ser muito bom pra imagem.
NET Educação – O que achou do cancelamento da Conae [Conferência Nacional de Educação] esse ano?
Cara – Na Conae, a comunidade educacional deixaria claro que o texto da Câmara é melhor que do Senado. Geraria uma pressão muito grande para a votação no Plenário da Câmara. Os rumos seriam mais favoráveis para nós com relação ao PNE e nem tanto para o governo. Acredito que foi uma decisão política.

 

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