O que dizemos ou fazemos no espaço público é, evidentemente, público. Embora isso seja um truísmo, nos dias de hoje, marcados pela hiperconexão, rapidez na circulação das informações e grande capacidade das instituições e indivíduos manipularem-nas, é algo que merece ser lembrado.

É fácil cometer erros, por exemplo, tornando públicos comportamentos e comentários mais ou menos cabíveis em círculos íntimos, mas incompatíveis com o debate esclarecido. Que o diga o economista e colunista da revista Veja Cláudio de Moura Castro. Como todo mundo que acompanha o noticiário sobre educação, assisti ao comentário de humor infeliz feito por ele numa audiência no Congresso (aqui).
 
Moura Castro tem opiniões sobre o Plano Nacional de Educação – PNE (ver esse artigo) que contextualizam a declaração: acreditando que o Plano possui uma série de “besteiras”, resolveu sugerir mais uma. Porém, a piada saiu do ponto.
 
Sem que isso abone o comentário preconceituoso, o que chama atenção é o quanto a hiperconexão e a indistinção entre o espaço público e o privado podem ter consequências negativas. Situações desse tipo bloqueiam o debate. O que talvez seja mais substantivo (mesmo na pequena fala do vídeo) na avaliação de Moura Castro é a ideia de “capital humano”, que ele associa fortemente à educação. 
 
A educação entra no cálculo dos projetos de desenvolvimento de uma nação, no entanto, não se reduz à dimensão econômica. Esse é o aspecto que merece mais discussão. Esta, porém, fica inviabilizada quando se tem como antagonista alguém que é visto como racista.
 
É interessante também pensar na questão da manipulação das imagens e representações. Toda representação do real, nas mídias, é mais ou menos manipulada, pois essa é uma condição intrínseca da mediação humana e tecnológica. No entanto, existem manipulações inaceitáveis por induzirem ao erro. 
 
Este foi o caso de uma psicóloga que teve sua fala, num evento na Câmara Federal, editada por um deputado de extrema direita, de modo que ela pareceu defender a pedofilia (o caso é relatado nesta reportagem).
 
Aqueles que assistem ao vídeo editado sem entender o contexto (o que inclui quem o editou) podem ser levados a juízos equivocados. Isto causa prejuízos à reputação dos que são vítimas de manipulações desse tipo, bem como à própria sociedade. Novamente, agora pela má fé de um dos lados, que distorce a opinião do outro, o debate torna-se inútil.
 
A democracia caracteriza-se, no seu melhor, pela crença de que nos debates, na escuta respeitosa dos argumentos alheios, podemos aperfeiçoar nossos conhecimentos, opiniões e, até mesmo, mudar o que pensamos. Em tempo de opiniões “fast food”, indistinção público/privado e manipulações desonestas, essa crença se torna, muitas vezes, uma ilusão.
 
Cabe à escola enfocar esses pontos, assim como tentar ajudar os estudantes a fazer uma leitura crítica das manipulações com o uso da mídia que envenenam o espaço público.

O Instituto Claro abre espaço para seus colunistas expressarem livremente suas opiniões. O conteúdo de seus artigos não necessariamente reflete o posicionamento do Instituto Claro sobre os assuntos tratados.

Autor Richard Romancini

Richard é doutor em Comunicação, pesquisador e professor do curso de pós-graduação lato-sensu em Educomunicação da ECA-USP.

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