A professora de língua portuguesa do 3º ano do ensino médio no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (Nova Cruz, RN), Patrícia Barreto, levou para a aula fotos vencedoras do prêmio Pulitzer como recurso para avaliar a leitura de mundo e a capacidade de linguagem de seus estudantes. Durante a exposição oral, ela percebeu que eles conseguiam fazer o recorte da temática e se posicionavam sobre o tema, contudo, apoiavam-se em justificativas de senso comum para embasar o ponto de vista.

“Na apresentação da foto ‘O terro da Guerra’, de Nick Ut [a conhecida fotografia de crianças aterrorizadas durante um bombardeio na Guerra do Vietnã], o posicionamento era de total discordância com relação à violação dos direitos humanos. Eram utilizados discursos como: ‘não se pode fazer isso com uma pessoa, porque todos merecem viver’ ou ‘as crianças não podem sofrer com as guerras, pois são o futuro da nação’”, ilustra Barreto.

“As produções eram deficitárias na relevância da informação como justificativa de um posicionamento crítico. E dificilmente se conquista o protagonismo cidadão sem se posicionar de forma relevante no mundo”, justifica.

Com o diagnóstico em mãos, a professora elaborou uma sequência didática com quatro etapas: produção de foto, escrita de artigo opinativo, elaboração de um jogo de argumentação e, ao final, a gravação de um podcast.

Olhar sobre o mundo

O primeiro passo foi “afiar” o olhar dos alunos sobre o mundo convidando-os a expressarem uma denúncia social local, por meio do fotojornalismo. Com seus celulares, eles captaram problemas da escola e do entorno, como falta de saneamento básico, descarte inadequado do lixo, ausência de pavimentação em ruas, desigualdade na distribuição da água potável, espaços públicos sem acessibilidade, trabalho infantil e sucateamento de instituições de ensino públicas.

Após a foto autoral, os estudantes refletiram sobre a problemática abordada no registro de um artigo de opinião. “Exemplifiquei as estratégias argumentativas por meio da leitura de artigos de opinião das Olimpíadas de Língua Portuguesa de 2016. Fizemos a leitura coletiva dos textos, identificamos o recorte temático, o posicionamento e os argumentos, analisando a natureza das justificativas produzidas e sua relevância”, relata. “Nesse momento, eles externalizaram a voz do cidadão crítico”, acrescenta.

Na sua produção, muitos transgrediram características linguísticas e discursivas do gênero opinativo. Assim, antes de partirem para a versão final do artigo, houve a necessidade de complementar a estratégia usando um jogo lúdico, elaborado pela própria turma.

“O jogo Argument(ação), foi construído com perguntas produzidas pelos estudantes sobre as problemáticas abordadas nas fotos. Eles sorteavam duas cartas com estratégias argumentativas diferentes e precisavam elaborar respostas que revelassem tanto o seu posicionamento particular quanto as estratégias sorteadas”.

Expressão em áudio

A última etapa foi transformar o artigo de opinião em um podcast – arquivo digital de áudio transmitido pela internet. O programa dos alunos foi batizado de “Desxculpa Aí!”.

“Ao produzir a última versão do artigo de opinião, percebemos que tínhamos em mãos um painel dos principais problemas sociais do agreste potiguar produzido por moradores, que diariamente são afetados por essas questões, jovens preocupados e atentos com o desenvolvimento de políticas públicas de seus municípios. Isso precisaria reverberar fora dos muros da escola”, justifica Barreto. “Dessa forma, procuramos um meio inovador para divulgar esse material”, enfatiza.

Segundo a estudante Hercília de Oliveira Costa Damaceno Lima, 18, foi possível ver a evolução da turma ao comparar as primeiras versões do artigo de opinião com a final. “O aluno está muito acostumado a entender o que é a argumentação. No entanto, dificilmente busca mecanismos para enriquecer o discurso – o que torna o debate escasso. Por isso, a necessidade de busca por novas informações foi um obstáculo a ser vencido”, opina.

O registro da fotografia denunciando um problema social foi a parte preferida do projeto para o aluno Diraldo Bezerra Filho, 18 anos. “Isso ajudou muitos estudantes a desenvolverem seu senso crítico”, diz ele, que considera sua argumentação hoje “mais variada e bem elaborada”.

O projeto de Patrícia Barreto foi um dos dez vencedores do Prêmio Educador Nota 10, de 2019.

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Crédito da imagem: Qvasimodo – iStock

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