“Fora de Série” é o mais recente documentário produzido pelo Observatório Jovem do Rio de Janeiro, da Universidade Federal Fluminense (UFF). A produção traz o relato de treze jovens que cursam a educação de jovens e adultos (EJA) no Rio de Janeiro sobre os motivos que os levaram a abandonar a formação regular. Mobilidade, violência e racismo são alguns dos temas que aparecem nas histórias.

“Além disso, o filme aborda a relação dos jovens com os professores e com o saber. Nesse sentido, ele é importante para educadores de todas as etapas de ensino”, justifica o diretor e professor da pós-graduação em educação, da Universidade Federal Fluminense (UFF), Paulo Carrano.

O documentário estreia em 8 de março de 2018 na UFF, mas pode ser exibido gratuitamente por escolas, universidades, organizações não governamentais (ONGs) e outras instituições de todo o Brasil. Para isso, os interessados devem entrar em contato via site solicitando o filme em alta resolução.Confira, abaixo, uma entrevista com Paulo Carrano.

Qual foi a origem deste “filme-pesquisa”?

Paulo Carrano: A pesquisa teve uma origem clássica e buscou conhecer situações e contexto de escolarização na educação de jovens adultos (EJA). Na primeira fase, mil pessoas de 14 escolas do Rio de Janeiro responderam a um questionário sobre as variáveis que as levaram a abandonar o ensino regular, estando hoje fora da série ideal – que deu nome ao filme. O objetivo era tentar entender essa trajetória não linear. Esse primeiro material gerou três dissertações de mestrado e um doutorado em andamento.

Como foi a escolha dos alunos que tiveram as suas histórias gravadas?

Paulo Carrano: 500 entrevistados possuíam até 29 anos. Ao final, perguntamos se eles aceitariam participar da segunda fase da pesquisa, que seria gravada. Dos estudantes, 240 toparam. Após um balanço de agendas, e prezando por um equilíbrio de gênero e de localidade entre os estudantes selecionados, chegamos aos 13 entrevistados do filme. Dessas histórias, três são aprofundadas.

Jovens ouvidos na pesquisa durante as gravações do documentário (crédito: Eduardo Santos)

O que vocês buscaram por meio das entrevistas?

Paulo Carrano: O diálogo com os alunos foi mais aberto e menos inquisitivo. Não os tratamos como informantes, mas como sujeitos de diálogo. O objetivo foi trazer uma perspectiva reflexiva. Os 13 entrevistados foram convidados a trazer um objeto pessoal que se relacionasse com sua trajetória na escola, trabalho ou cultura. Para três desses, entregamos uma câmara e pedimos imagens e fotos que representassem memórias e aspirações. Nossa intenção era trazer as subjetividades desses sujeitos, contar a história de pessoas que passam pela escola. A instituição de ensino sabe que dentro dela há pessoas que são mais que alunos: são mães, pais, imigrantes, entre outras facetas, que nem sempre tem condição de reconhecer.

O que os jovens relatam sobre as causas da evasão escolar?

Paulo Carrano: Não é novidade que a escola precisa ser mais interessante, mas não só. Esses jovens abandonam os estudos por questões internas e externas à escolarização. Eles relataram problemas de violência e de mobilidade, tendo que estudar em escolas distantes ou de difícil acesso. Vale lembrar que o ensino médio era restrito, até pouco tempo, às elites, sendo um fenômeno recente para as classes populares. Quando esses jovens chegaram à escola, nas décadas de 90 e 2000, encontraram uma instituição despreparada para recebê-los em infraestrutura e na formação de professores, que esperavam encontrar um jovem idealizado, com valores culturais diferentes. Isso distancia o aluno da escola.

Por que é importante dar voz a esses jovens?

Paulo Carrano: Os jovens da periferia são bombardeados de representações negativas sobre si que não representam a realidade. Acredito que muito desse genocídio da juventude negra brasileira tem fruto na representação do que é ser jovem e negro hoje. Isso reflete, por exemplo, quando vemos imagens da intervenção militar, em que policiais revistam as mochilas das crianças e jovens do morro. Quando eles são ouvidos e essas representações são deixadas de lado, abrem-se.

Por que professores e alunos devem assisti-lo?

Paulo Carrano: O filme aborda a relação desses jovens com os professores e com o saber. São questões importantes a todas as etapas de escolarização.Uma das entrevistadas, por exemplo, falou: “faltou o professor dar mais atenção”. Quando ela diz algo assim, não é uma mera cobrança, mas lança luz sobre o fato do educador não estar preparado para lidar com um estudante que é um sujeito cultural completo; que está inserido em uma realidade tecnológica; que é difícil dar atenção em uma classe superlotada, depois de jornada de trabalho exaustiva e mal remunerada. Assim, o filme ajuda a refletir sobre a condição pedagógica.

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