A bonificação salarial por desempenho é um adicional pago aos professores mediante resultados. A política nasceu nos Estados Unidos e foi amplamente abraçada por Estados brasileiros, como São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Espírito Santo. Nesses casos, a performance do educador é associada às avaliações em larga escala dos alunos, tais como SAEB, ANA, ENEM e Prova Brasil.
Para os defensores da medida, a bonificação ajuda a reconhecer talentos e estimula o trabalho docente. “Considero que os sistemas educacionais que mais avançam no mundo são os que implantam uma cultura de avaliação e um modelo de gestão por resultados, a partir das evidências apresentadas pelas avaliações externas e internas. Nesse modelo, é fundamental estabelecer metas claras de aprendizagem e reconhecer, por meio de políticas de bonificação, os avanços realizados na consecução dessas metas”, opina a professora Emérita da UFMG e secretária de Estado de Educação de Minas Gerais entre 2011 e 2014, Ana Lúcia Gazzola.
A modalidade, contudo, foi criticada no Relatório de Monitoramento Global da Educação 2017/8, produzido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Segundo o documento, além de não demonstrar bons resultados, ela responsabiliza apenas o professor pelos êxitos e fracassos dos alunos, desconsiderando questões intra e extraescolares.
“A aprendizagem escolar é um processo cognitivo que depende do estudante, do professor e da escola. O maior problema das políticas de bonificação é isolar a escola do contexto social em que ela está inserida”, contrapõe o mestre em educação e professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí, Roniel Sampaio Silva.

Fome e esgotamento

Segundo o docente do curso de Pedagogia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Carlos André Sousa Dublante, as políticas de bonificação partem do princípio que todos os alunos possuem as mesmas condições materiais e sociais de aprendizagem. “Ignoram, por exemplo, se esse estudante faz as refeições diárias mínimas para contribuir com seu desenvolvimento físico e cognitivo; se a escola concorre com a necessidade de trabalhar”, pontua.
As condições de trabalho do professor tampouco são avaliadas, como o não cumprimento do piso salarial pelos Estados e municípios, classes lotadas e a necessidade de dupla jornada para completar a renda. “A Emenda Constitucional nº 95 (EC 95/16) limitou os investimentos públicos em Educação por 20 anos. Como garantir práticas pedagógicas criativas sem os recursos necessários?”, questiona o Doutor em Educação e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Jéferson Dantas.
Para o pesquisador, bonificação ainda “maquia” a falta de políticas de salário. O benefício, por exemplo, não é incorporado na aposentadoria do educador. “Ela está na contramão de políticas para fortalecer a profissionalização, como ampliação de concursos públicos, valorização das carreiras, formações continuadas regulares etc.”.

Efeitos colaterais

Professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Ocimar Munhoz Alavarse, defende que “o resultado de uma prova não é fruto do que foi ensinado naquele ano, mas do acúmulo de diversas condições”. “Atribuir tudo isso ao professor é exagero”, sintetiza.
O educador ainda considera falho o sistema utilizado para “premiar” os professores. “Bons profissionais de escolas mal avaliadas não receberão a bonificação, enquanto professores ruins de escolas bem avaliadas serão contemplados”, pondera. “As avaliações em larga escala podem ser um indicativo de trabalho, mas não ‘o’ indicativo”, critica.
Um efeito colateral da política de bonificação é o direcionamento dos conteúdos a serem ensinados nas escolas para aquilo que será cobrado nas avaliações em larga escala. “Os resultados são considerados mais importantes do que o processo de ensino e aprendizagem”, resume Dantas.
A professora de Educação Física, Eliane Dolce Guerriero, viveu isso na pele. “Trabalhei na rede estadual e as provas aplicadas a algumas turmas de uma escola avaliavam todos os professores, o que era injusto. Direcionava-se, então, todo o trabalho para o conteúdo daquela prova”, relata.
Outra consequência é estigmatização das escolas, Estados e municípios com os piores resultados. “Fica a ideia de que, nas escolas que atingem as melhores notas, os professores estão mais preparados”, destaca Dublant.
Como uma saída para o problema, o relatório da Unesco defende a responsabilização compartilhada de todos os atores em relação à educação – não apenas dos professores. “Não é para a sociedade tomar para si as responsabilidades que são do Estado, mas, que exerça o seu direito de cobrar políticas que garantam o acesso, a permanência e o sucesso do aluno na escola”, finaliza Dublant.
Em nota oficial, a Secretaria de Educação de São Paulo afirma que “a bonificação foi criada em 2008 e se constitui em instrumento da política de remuneração e valorização do Magistério. Ainda assim, o Estado de São Paulo paga 5% acima do piso nacional mais o acréscimo de benefícios”. A reportagem não obteve retorno das Secretarias do Espírito Santo e Pernambuco.
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