“Clame a saparia. Em críticas céticas: não há mais poesias, mas há artes poéticas”. Lido sob vaias e aplausos na Semana de Arte Moderna de 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, o poema “Os Sapos”, de Manuel Bandeira, é um exemplo daquilo que se tornaria sua marca registrada. Versos livres e aparentemente simples, mas capazes de provocar uma reflexão profunda. No caso específico do texto, uma crítica cheia de ironia aos poetas parnasianos e sua afeição à métrica.

“Foi um autor que revolucionou nossa poesia pela simplicidade aparente da sua produção, que se dá tanto em relação às formas estéticas como em relação às temáticas. O humor irônico, o ritmo e um fazer poético imerso em contradições são outras características”, analisa a mestre em literatura brasileira pela Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora da obra do autor, Bárbara Campos.

13 de outubro marca os 50 anos do falecimento de autor. Originário de uma família de advogados e políticos de Pernambuco, viu sua juventude ser marcada pela tuberculose e por uma internação hospitalar na Suíça, onde teve como colega de sanatório o poeta Paul Eluard. De volta ao Brasil, lançou o primeiro livro em 1917: “A cinza das horas”.

Segundo Campos, é possível perceber uma forte influência de Manuel Bandeira na poesia brasileira, principalmente após o movimento Modernista. “Ainda que não se declare diretamente parte ou precursor do Modernismo, ele influenciou toda essa geração e as que vieram depois dela, com sua conquista do verso livre e o uso da linguagem coloquial, presente em poemas como ‘Os sapos’ e ‘Libertinagem'”, descreve Campos. “A partir dele, a técnica se aproxima ao prosaico e à fala brasileira”, aponta.

Contradições

Eram temas estimados na obra de Bandeira a infância, a morte, o povo brasileiro, o cotidiano e personagens reais reinventados na poesia. Para a pesquisadora, o professor que pretende apresentar o poeta aos alunos deve se atentar a necessidade de uma leitura ativa, estimulando a descoberta de temáticas que estão além do que é aparentemente representado.

“O poema ‘Balõezinhos’, por exemplo, parece trazer uma simples cena cotidiana e uma ternura, reforçada pelo uso do diminutivo. Na verdade, traz um contexto complexo: reforça os balõezinhos como mercadoria e como desejo de meninos pobres. Além do cotidiano alienado da feira que ‘burburinha’, mas é carregada de tensões, como ‘burguesias pobres’ em contraponto a ‘burguesias ricas”, descreve.

Outro exemplo é o conhecido “Poema tirado de uma notícia de jornal”, que narra o afogamento de João Gostoso. “O personagem que mergulha e vive a história trágica está à margem das instituições: não tem registro, o sobrenome é substituído por um apelido, suas características não o humanizam e ele fica na fronteira de ser cidadão e não ser”, assinala. “No próprio texto: ‘João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número'”.

Por fim, a pesquisadora destaca que as contradições existentes na produção de Manuel Bandeira não são apenas estéticas, mas um pretexto para o leitor também refletir sobre as oposições da sociedade. “Na obra banderiana, entramos em contato com alguns elementos opostos. Aspectos que não são só do poema, mas da sociedade brasileira e do ser humano, tais como: passado e presente; modernização e retrocesso; alegria e melancolia; capitalismo e ruralismo; público e privado; entre outros”, finaliza.

Crédito da imagem: Flickr Arquivo Nacional do Brasil

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